Manifesto sem prisões

19 set 2018

“A prisão representa muito mais do que a privação de liberdade com todas as suas seqüelas. Ela não é apenas a retirada do mundo normal da atividade e do afeto; a prisão é também principalmente, a entrada num universo artificial onde tudo é negativo. Eis o que faz da prisão um mal social específico: ela é um sofrimento estéril.” (Louk Hulsman)

O Projeto “Direito Humanos e Justiça Criminal: Enfrentando a prisão provisória e o encarceramento em massa no Brasil” é desenvolvido pelo Instituto DH: Promoção, Pesquisa e Intervenção em Direitos Humanos e Cidadania em parceria com o Laboratório de Estudos sobre Trabalho, Cárcere e Direitos Humanos – LabTrab UFMG com o Grupo de Amigos e de Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade de Belo horizonte- MG para enfrentar o encarceramento em Minas Gerais, monitorar as unidades prisionais do estado e atuar na garantia da vida e da dignidade dos presos e para, enfim, desencarcerar presos provisórios. Este projeto, financiado pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos, nasce de uma preocupação com o absurdo crescimento do número de presos provisórios e de mulheres presas no país, sendo Minas Gerais protagonista neste cenário preocupante.
De fato, convivemos com prisões, manicômios e outras construções para privação de liberdade há tanto tempo que, muitas vezes, não pensamos muito sobre esses espaços e sobre seu assombroso crescimento. Afinal, aprendemos que punir os delinquentes é um mal necessário para manter a ordem e tranquilidade da sociedade. Podemos até nos incomodar com as condições de superlotação, agressões, tortura, revistas vexatórias e outras violações dos direitos dos presos e presas. Mas, em geral, pedimos por mudanças dentro das prisões.:celas mais limpas, maiores, com colchões melhores e atendimento médico não deixam de ser celas. É verdade que as condições no interior das unidades prisionais são terríveis, e que isso precisa mudar com urgência, os presos devem ter todos seus direitos assegurados. Entretanto, enquanto não questionarmos a prisão e todos os castigos como forma de lidar com nossas situações problemáticas, não conseguiremos abolir a punição e o sofrimento.
Nosso referencial é o abolicionismo penal, uma forma de ver e agir no mundo que visa abolir o castigo enquanto moral. Uma anti-doutrina que vem sendo pensada e praticada ao longo de décadas. Antes do nascimento da prisão, o castigo era imposto diretamente no corpo e a pena de morte era comum para os crimes considerados mais graves. Os primeiros a questionarem este modelo foram chamados de abolicionistas do castigo e abolicionistas das penas de morte. A prisão surgiu como uma justificativa de racionalizar e humanizar as penas, rompendo com o castigo focado na promoção de dor física, para um castigo que rouba o tempo e a liberdade.
A história nos ensinou que não é suficiente questionar uma forma de punição, porque sempre pode surgir outra no lugar. Quando se fala em substituição da prisão pelo monitoramento eletrônico, prisão domiciliar, cadastro de agressores por exemplo, devemos questionar se tais práticas não são uma nova prisão sem muros e mais adaptada ao nosso tempo. Não se trata simplesmente de criar mais depósitos de rejeitados, mas de refinar e aumentar exponencialmente as formas de controle.
Em todas as sociedades nas quais existe Direito Penal, as pessoas agem de forma a punir situações que o Estado define como crime. Ainda que não saibamos, nós cometemos vários crimes, inclusive, não saber que algo é criminalizado não nos torna menos responsáveis. Ainda que sejamos todos “criminosos”, nem todos somos controlados e punidos por isso. Essa aparente distorção é característica fundamental do sistema penal; é por ser falha que a prisão é perfeita na sua função de escolher, na sociedade, as pessoas que vão sofrer por serem taxadas como criminosas.
A prisão é um local de sofrimentos, todos que participam desse sistema sofrem: presos, familiares e trabalhadores. Os ideais de ressocialização são mentiras que legitimam o castigo. Privar alguém de sua liberdade não torna alguém melhor ou mais adaptado, apenas exclui e tortura. Um mundo sem castigos e prisões é possível e acontece cotidianamente. Abolir a prisão e o castigo é que nos move!

Então, o que queremos:
– Fim do encarceramento de jovens.
– Fim das Prisões Provisórias.
– Fim à proibição das drogas, pois se trata de uma evidente justificativa social para realizar controle e extermínio da população pobre e negra no Brasil.
– Libertação de todas as pessoas arbitrariamente presas em decorrência da política de criminalização das drogas.
– Abolir a indústria de monitoração eletrônica. A monitoração expande a prisão para muito além de seus muros, é estar preso em casa, na rua, no trabalho, perder o controle do seu corpo estando ainda vivo.
– Impedir que novas condutas sejam criminalizadas, o aumento da abrangência do estado penal apenas aprofunda o encarceramento. Não existe garantia de direitos via sistema penal.
– Liberdade para mães e pais responsáveis pelos cuidados de seus filhos e filhas menores de doze anos de idade.

Para ler:
http://carceraria.org.br/
http://sociedadesemprisoes.blogspot.com/
http://www.nu-sol.org/
http://www.fafich.ufmg.br/labtrab/